🤔 Michael Saylor: Gênio ou Louco?
A estratégia da MicroStrategy: uma dinâmica infinita ou apenas mais um caso de alavancagem financeira?
Recentemente é difícil encontrar uma conversa sobre bitcoin (BTC) ou ações nos EUA que não envolva a MicroStrategy (MSTR) e a estratégia do Michael Saylor, chairman da empresa. Seja porque as ações da empresa figuraram entre as mais negociadas na Nasdaq, seja pela emissão de um bond conversível em ações com juros zero e prêmio de conversão de 55% sobre o preço atual, a MSTR está no centro das atenções em discussões tanto de mercados financeiros tradicionais quanto do universo cripto. Mas será essa estratégia uma genialidade sem precedentes ou apenas mais um caso emblemático de alavancagem financeira? Isso criará uma profecia autorrealizável que levará o preço do Bitcoin a patamares hoje inimagináveis, ou será a pá de cal na ideia libertária que esse ativo representa? É sobre isso que me debruçarei a seguir. Vem junto!
A Estratégia da MicroStrategy
A MSTR operacionalmente falando é uma empresa de software que oferece soluções de Business Intelligence (BI) ao mercado, sustentando um modelo de negócios altamente gerador de caixa. Há pouco mais de quatro anos, Michael Saylor, então CEO, convenceu o board de que a melhor estratégia seria investir o grande caixa da empresa em Bitcoin. Assim, em julho de 2020, a MicroStrategy fez sua primeira aquisição: 21.454 bitcoins ao custo de US$ 250 milhões, tornando-se a primeira empresa listada na bolsa americana a investir em BTC.
Desde então, Saylor deixou o cargo de CEO, assumiu uma posição no board, e passou a focar em adquirir mais bitcoins — agora não apenas com o caixa da empresa, mas também através da emissão de ações e dívidas. No momento que escrevo, a MSTR possui 386.700 bitcoins, adquiridos a um preço médio de US$ 55.761, e que valem mais de US$ 37 bilhões em valor de mercado.
Não bastasse isso, o Michael Saylor se tornou o maior defensor mundial do bitcoin, falando sobre os benefícios desse ativo perante os demais em toda e qualquer oportunidade que tem e colocando a microstrategy como a refinaria do mercado mundial de capitais (uma alusão às refinarias de petróleo que tem um estoque de óleo enorme, mas que não tem utilidade direta, e que o transformam em gasolina, diesel etc. para que todos possam usar). E com o preço do BTC subindo e sua estratégia se mostrando efetiva, veio mais e mais publicidade. Recentemente, a MSTR anunciou uma nova emissão de US$ 3 bilhões em dívida conversível, novamente destinada à compra de BTC e vou pegá-la como exemplo da arquitetura financeira (refinaria) que ele criou.
A Emissão de Bonds
Para quem conhece o mercado financeiro, o instrumento emitido pela MicroStrategy se assemelha ao que no Brasil chamamos de COE (Certificado de Operações Estruturadas) de capital garantido. Funciona assim: o investidor aplica a juros zero e, no vencimento, pode escolher entre receber o capital inicial de volta (sem correção) ou convertê-lo em ações da MSTR a um preço previamente definido — US$ 672 no caso desta emissão, enquanto a ação atualmente está cotada a cerca de US$ 400. A conversão só faz sentido se o preço da ação superar US$ 672, um prêmio de 55% em relação ao preço atual, num prazo de cinco anos.
Por que alguém compraria esse bond?
A resposta rápida é: porque acredita que o Bitcoin subirá mais de 55% nesse período. Com a atual volatilidade anualizada do bitcoin em cerca de 60%, essa alta é plausível e torna o bond conversível um investimento atraente. Conversando com o Vasarhelyi sobre essa empresa, ele mencionou uma conta muito interessante que fez: considerando o risco de crédito da MSTR (B-), o valor da opção de compra de MSTR no futuro e o valor de mercado da empresa vis a vis a quantidade de bitcoins em tesouraria, o bond teria um valor de mercado de ~ 140, bem acima dos 100 que ele é comprado na emissão, tornando a compra dele uma opção quase óbvia para qualquer investidor que entenda do mercado de crédito e opções.
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Além disso, para arbitradores, comprar o bond e fazer hedge via venda de uma opção de compra de BTC poderia gerar grandes ganhos, já que a volatilidade implícita das opções de BTC supera os 55%. Contudo, isso esbarra em dois desafios: 1) baixa liquidez no mercado de opções de BTC para prazos longos; 2) risco de crédito da MSTR, já que o bond é conversível em ações da empresa, não diretamente em bitcoins.
Mas isso só conta um lado do hedge que é o contra o mercado de bitcoins. Um outro, até mais óbvio, é ao invés de fazer o hedge no BTC, fazê-lo diretamente em ações da MSTR. Vendo essa emissão de bonds conversíveis como compra de opção de compra de MSTR para 5 anos, e dado que a volatilidade da ação da MSTR hoje tem uma volatilidade de mais de 100%, a gestão desse risco faz com que o detentor dele tenha que ficar negociando a ação sempre que ela tenha alguma variação, efeito conhecido tecnicamente como gestão de gamma, o que traz um ganho bastante grande para o administrador dessa posição além de aumentar a liquidez e negociação da ação.
Outro ponto relevante é que muitos investidores institucionais americanos não têm aprovação em suas políticas para comprar BTC diretamente ou via ETFs, mas podem adquirir bonds de empresas listadas. Isso gera uma enorme demanda por estruturas como a criada por Saylor, e justifica o prêmio baixo em relação à volatilidade implícita do bitcoin ou da própria ação da empresa.
Essa maior acessibilidade para os institucionais, principalmente via ETFs, foi uma das razoes para a Citron, um fundo conhecido por fazer short selling de empresas, colocar recentemente a MSTR na sua lista de ações para serem vendidas (além do fato de ter subido muito rápido e estar “overheated” na opinião deles), mas segundo o Saylor eles estão perdendo a big picture aqui, será?
Bem, não sei qual das razoes acima levou a compra (talvez as 3?), mas o fato de termos a Allianz, uma das maiores seguradoras do mundo, comprando 25% desse último bond é um bom exemplo de que a demanda por ele está aí.
MSTR: Uma Proxy Alavancada para o Bitcoin
Com essa estratégia, as ações da MicroStrategy se tornaram uma proxy alavancada para o preço do Bitcoin. Hoje, além de seguir a direção do BTC, a ação o segue com uma volatilidade e intensidade muito maiores.
No curto prazo, toda essa dinâmica está gerando uma demanda crescente por Bitcoin no mercado à vista, alimentando o sentimento de FOMO (medo de perder a oportunidade) - quanto mais o BTC sobe, mais a estratégia de Saylor parece vitoriosa, elevando o preço das ações da MSTR, abrindo espaço para mais emissões de dívida e ações, mais compras de BTC, e assim por diante. O ciclo se retroalimenta, potencializando o preço de um ativo com oferta limitada.
Adicionalmente, o aumento colossal da liquidez e da negociação das ações da MSTR – no dia 20/novembro ela foi a ação mais negociadas dos Estados Unidos -, deve aumentar sua participação nos índices da bolsa, forçando fundos passivos a comprá-las para replicar esses índices. Isso pode/deve fazer com que a ação suba ainda mais, aumentado o prêmio entre o valor de mercado da empresa sobre seus ativos em BTC, abrindo espaço para mais emissões de ações e, consequentemente, mais compras de Bitcoin.
Sobre esse aumento de liquidez, o efeito da administração do gamma referente a esse bond, faz com que a liquidez e negociação da ação aumentem bastante à medida que a quantidade de bonds a mercado aumente, o que faz com que sua participação nos índices tenda a subir cria uma dinâmica que se retroalimenta.
O Outro Lado da Moeda
Tudo parece lindo e pronto para exponencializar, mas será mesmo? O que poderia interromper esse ciclo positivo? Um exemplo sempre citado seria uma queda brusca do preço do BTC para, digamos, US$ 25.000. Nesse cenário, as reservas de BTC da MSTR perderiam 75% de valor, impactando severamente o preço das ações. Isso, no entanto, não obrigaria a empresa a vender bitcoins imediatamente, já que a maior parte das dívidas emitidas vence a partir de 2027. Além disso, o prêmio do market cap da MSTR sobre seus ativos (atualmente cerca de 3x) sugere que a empresa poderia emitir mais ações em caso de necessidade de liquidez, evitando liquidar suas reservas de BTC.
Outro fator é que para o detentor do bond, mesmo que a ação vá a zero, dado a volatilidade para que isso aconteça, a gestão do gamma nesse caminho pode dar um lucro gigante que compensaria o valor residual zero do bond no vencimento. E aqui tem menos a ver com o preço do bitcoin e mais com a dinâmica da ação da Microstrategy em si.
Dessa forma, a estratégia parece resiliente e pode (deve) até ser replicada por outras empresas com estruturas de capital similares, gerando ainda mais demanda por um ativo de oferta escassa.
As duas dinâmicas entre bonds conversíveis/ações e a posição/compra de bitcoins, são dinâmicas que se retroalimentam em uma espiral positiva e que sinceramente não vejo formas de mercado de serem paradas. Ela poderia gerar um efeito contrário em um movimento de queda? Sinceramente não consigo ver como, ainda mais considerando o mecanismo da ATM (at the market), onde a Microstrategy poderia vender ações de sua tesouraria a mercado para fazer caixa no caso de necessidade. Hoje, com o preço da ação/volume de BTCs próximo de 3x, na verdade o que ela está fazendo, e deve continuar, é usar esse mecanismo para não deixar esse 3x ir para o infinito e comprar mais BTC, criando talvez uma terceira dinâmica que se retroalimenta. (Se você entendeu o mecanismo que expliquei e consegue ver uma dinâmica de queda se retroalimentando no curto prazo me chama para discutirmos!)
Gênio ou Louco?
Agora tentando responder à pergunta que me fiz no começo, isso caberá à história responder, mas no momento o génio está prevalecendo e Saylor pode entrar para história como o maior trader do mundo. Assim como Soros apostou contra o banco da Inglaterra e ganhou bilhões na década de 90 podemos estar vendo a maior aposta contra o mercado financeiro tradicional mundial da história, com valores e consequências infinitamente maiores para o mundo que a aposta que o Soros fez.
E para terminar, não poderia deixar de agradecer ao Alexandre Vasarhelyi pelas discussões que tivemos que me ajudaram muito a ver alguns aspectos que eu não tinha observado a princípio. Obrigado!
Como sempre, deixo abaixo uma cotação que acredito representar bem esse momento e algumas perguntas para pensarmos e respondermos juntos.
A cotação: “O gênio é o louco que teve coragem de tentar e conseguiu acertar."
As dúvidas: Onde termina o ciclo positivo de emissão de bonds e ações para comprar BTC? Qual o limite dessa estratégia? Terá o Michael Saylor conseguido encontrar várias dinâmicas de mercado que se autoalimentam e são imparáveis? Qual o impacto de tamanha concentração de BTC em um único agente? De onde poderia vir a necessidade de a MSTR vender seus BTCs além do vencimento dos bonds? Regulação?
Abcs,
Gustavo Cunha
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Links utilizados para esse artigo:
➡️ MSTR Tracker - MicroStrategy Stock and Bitcoin Metrics
➡️ Post Linkdin Alexandre Vasarhelyi
➡️ MicroStrategy arranca na compra de Bitcoin após aumentar venda de títulos
➡️ Michael J. Saylor - Wikipedia
➡️ MicroStrategy Bonds - When Liquidation? | BitMEX Blog
➡️ Allianz acquires 25% of MicroStrategy's bonds
➡️ Post Linkdin Alexandre Vasarhelyi (2)
➡️ https://x.com/EricBalchunas – MSTR é a acao mais negociada no dia 20-nov nos USA
➡️ Microsoft Word - What_s the Deal - ATM Offerings (736995491_9).DOC
➡️ Michael Saylor - Year to date, $MSTR's treasury operations delivered a BTC Yield of 59.3%...
➡️ Michael Saylor- MicroStrategy has acquired 55,500 BTC...
➡️ SATOSH1 - In regards to issuing their stock to buy bitcoin…
➡️ Citron Research discloses short position in bitcoin buyer MicroStrategy | Reuters
➡️ Saylor Responds to the Citron Research SHORT Thesis | Chapter 32
** texto publicado em simultaneo na Blocknews e Fintrender
Muito bom! Este assunto ta muito interessante, sempre que puder escreva mais sobre.