💵 Será a fusão entre moeda e juros para onde caminhamos?
Com a tokenização da moeda isso pode acontecer antes do que esperamos. Mas como será? Quem ganha e/ou perde? O que mudará?
A tecnologia atual permite que funções da moeda como as conhecemos hoje, meio de troca, reserva de valor e unidade de conta, não necessitem mais ser totalmente segregadas para que elas sejam cumpridas e isso pode trazer uma enorme transformação em todo o sistema financeiro mundial. Explico.
À medida que temos as moedas representadas em Blockchains, ou usando um termo que está mais na hype, tokenizadas, o uso de um determinado token representativo dessa moeda que incorra em juros para o dia a dia é uma alternativa que aparece e muda muito da estrutura e alocação de recursos.
Para exemplificar, nada melhor do que um exemplo inovador, e já consolidado em cripto. A LIDO finance, que hoje é a maior plataforma de staking de Ethereum, emite para cada depositante que coloque ETH em staking via sua plataforma um outro token stETH que pode ser usando livremente na plataforma da Ethereum. Fazendo um paralelo simples com o mercado financeiro tradicional, é mais ou menos como se aplicássemos em um fundo de investimento reais (BRL) e esse fundo emitisse quotas (chamarei de fdoBRL) que pudesse ser negociado livremente no mercado, servido inclusive para você pagar a sua conta no supermercado, compra de um carro etc.
Esse novo token (fdoBRL) seria uma nova moeda? Qual o risco sistêmico e de crédito que ele carregaria?
Continuando com o stETH, ele é um token que é aceito em praticamente todas as plataformas de DEFI tal qual o ETH, a diferença é que pelo mecanismo da LIDO, esse token stETH é um token que tem uma rentabilidade atrelada a ele que vem da função que o staking de ETH provem, ou seja, garantir a rede. Aqui o risco do staking pode ser entendido como o próprio risco da rede, já que se tivermos problema com a blockchain da Ethereum os ETH em staking estarão no topo da fila para responder por eles.
Uma coisa q o stETH ainda não consegue cumprir (destaque para o ainda) é a função de pagamento dos fees de utilização da blockchain da Ethereum, mas com account abstraction, é questão de tempo para termos tal funcionalidade. Nesse sentido, em um futuro muito próximo, é capaz que a imensa maioria dos ETH estejam depositados em staking em plataformas como a LIDO e que a “moeda” de transação na rede Ethereum, possivelmente passe a ser tokens similares ao stETH e não mais o ETH em si.
De volta ao mercado financeiro tradicional, imagine agora um fundo administrado pelo Tesouro Nacional do Brasil que tenha uma carteira composta única e exclusivamente por seus títulos e que você consiga depositar Reais (BRL) e receba em troca um token representativo da cota (TesBRL) e que possa interagir livremente em uma rede de blockchain disponibilizada e regulada pelo Banco Central do Brasil (DREX, já ouviu falar? 🤔) .
Você poderia pagar um café, fazer compras no supermercado, comprar um imóvel etc. com o TesBRL que seria amplamente aceito. Conseguiu visualizar?
Nesse cenário tudo seria trocado por TesBRL e não mais BRL, nossa moeda. Em termos econômicos a TesBRL seria um passivo do Tesouro Nacional e não do BCB. E é a partir daqui que as dúvidas e perguntas se amontam.
Estaria o Tesouro Nacional emitindo diretamente moeda? Mas isso não é função do BCB? Como separar essas duas entidades? Seria isso ainda necessário ou a tecnologia tornou essa divisão obsoleta? Como ficam as políticas monetária e fiscal? Tudo junto e misturado?
Um outro aspecto dessa discussão tem a ver com a enorme receita que todos os BCs incorrem por conta de terem o monopólio da emissão de moeda. Conhecido como senhoriagem no mundo econômico. Em termos simples é a diferença entre o custo de emitir R$ 50,00 (irrisório) versus o valor de face do que foi emitido. Seria o Tesouro em algum momento capaz de emitir TesBRL sem juros e se apropriar de toda a senhoriagem referente a isso? Tal qual o BCB o faz com o BRL?
Perguntas para os economistas responderem do ponto de vista teórico atualmente e muito provavelmente na prática nos próximos anos.
Já li alguns artigos sobre a possibilidade de termos uma CBDC de varejo que incorra em juros e, até onde conheço, esse não é o caminho de nenhum dos projetos dos BCs atualmente, principalmente pela possibilidade de disrupção do sistema financeiro atual que é baseado em moeda fracionaria e nas funções dos agentes bancários. Um acesso digital direto da população ao Banco Central já é um tema muito discutido, agora se o BC ainda pagar juros sobre ele, daí para que precisaríamos de Bancos? O problema é que funções que bancos fazem hoje (gestão de contas, empréstimos etc.) teria que passar para os BCs, o que ninguém acredita que seja o caminho atualmente.
Mas o ponto que levanto aqui é outro. Não é o caso de uma CBDC de varejo que pague juros. É a tokenização de um título do Tesouro que servirá como meio de pagamento, unidade de conta e reserva de valor, ou seja, moeda. Será o Tesouro o principal concorrente dos Bancos Centrais na questão de emissão de moedas? Muito mais do que os atuais projetos que tokenizam a moeda via stablecoins ou via a tokenização privada de títulos públicos? Estariam os BCs dormindo com o inimigo?
Pois é. Texto com mais dúvidas que respostas! Do tipo que adoro! 😉 E para continuar nada melhor do que juntar uma turma de feras nesse assunto. Vem conosco continuar essa discussão na 11ª edição do Money Innovation da FinTrender na próxima segunda-feira (11-set) as 14:00 BR.
Seguimos em contato nos links abaixo:
FinTrender.com, YouTube, LinkedIn, Instagram, Twitter, Facebook e podcast FinTrender.
* texto publicado originalmente na minha coluna da infomoney em 05.ago.2023