Seremos todos mineradores
Você pode não saber ainda, mas não está longe o dia em que se tornará um minerador de cripto
A mineração de cripto é um processo através do qual se dá origem a tokens pelo uso de capacidade computacional, energia e conexão à internet. Hoje já existem várias formas, algoritmos e protocolos de consenso, mas todos que conheço não fogem de ter que utilizar esses três fatores, de uma forma ou de outra.
A magia de ver isso dessa forma é que esses três recursos estão disponíveis na casa de grande parte da população do mundo. E aí vem a pergunta. Porque todos nós não nos tornamos mineradores de cripto?
A resposta para mim tem dois aspectos: um de conhecimento de programação, que vejo sendo resolvido, e outro de incentivo económico à descentralização. Vamos a eles
Uma parcela ínfima da população mundial tem conhecimento de programação suficiente para colocar um computador em uma rede para começar a participar da mineração.
Essa é uma barreira importante, mas que vejo sendo transposta por alguns projetos em que você compra uma “caixinha”, que nada mais é do que um computador pré-programado para fazer a mineração do token, liga ela na energia e na internet e começa automaticamente a ganhar os tokens pelo serviço que está prestando à rede. Essa é uma questão de User experience (UX) que projetos que envolvem uma cripto, uma blockchain própria e um algoritmo de consenso específico para essa rede, estão resolvendo de forma bastante interessante.
A Helium, por exemplo, é uma rede de blockchain que gera o token HNT e se propõe e criar uma rede descentralizada para internet das coisas (IOT).
Ela criou um aparelho, que chamam de hotspot, onde você o compra, conecta na internet e energia e ele já começa a gerar tokens HNT para você através de um protocolo de consenso chamado de prova de cobertura (proof of coverage)
Outro exemplo são os projetos descentralizados de guarda de dados em nuvem, ou Cloud.
Em alguns deles, você pode disponibilizar para a rede a capacidade de armazenamento que tem extra no seu computador recebendo tokens daquele projeto por isso. Mas aqui voltamos no mesmo ponto. É preciso um conhecimento específico de programação para fazê-lo.
Outros projetos resolveram isso te vendendo um computador específico, já totalmente pré-programado para disponibilizar a capacidade dele para a rede e ser remunerado com os tokens da rede por isso.
Esses dois exemplos que dei são de setores onde a distribuição faz muito sentido.
Redes de comunicação, como é o caso do que a Helium está montando, são muito caras de serem colocadas de pé, demoram e sua manutenção é complicada. Todos esses são fatores, que feitos de forma centralizada, colocam uma complexidade enorme nos projetos.
Quando feita de forma descentralizada e, obviamente, com os incentivos corretos, acaba ficando muito mais eficiente e barata. Só para terem uma ideia, a Helium mapeou praticamente todas as áreas urbanas dos EUA e Europa em pouco mais de um ano com uma rede LORAWAN, que é hoje uma das principais referências de rede para IOT.
E mais, dada toda essa capacidade instalada de mineradores, ou pontos de rede se quiser assim chamar, recentemente ela começou a testar, nos EUA, um plug-in para o aparelho que ela vendeu para ele também gerar uma rede 5G. Potencial gigante
Quanto ao mercado de cloud nem preciso me estender muito. É uma das principais fontes de receita da Amazon e os servidores centralizados que ela, e outros tem, são grandes consumidores de energia em termos mundiais. Por outro lado, todos nós temos em nossos computadores e celulares capacidade de armazenamento sobrando e que poderia ser disponibilizada.
A tecnologia para isso é um desenvolvimento do antigo Torrent. Quem lembra de baixar músicas e vídeos de vários computadores distribuídos há 10, 20 anos?
A ideia é a mesma, mas com mais robustez em quase todos os aspectos e com um modelo de negócio onde você é remunerado por prover essa capacidade.
Para que isso voe, chegamos ao segundo ponto: incentivos económicos.
Cabe aos empreendedores criarem modelos de negócio que façam sentido económico para as pessoas comprarem esses aparelhos, instalarem em casa e começarem a gerar uma rede de LORAWAN, no caso de IOT, ou disponibilizar capacidade computacional no caso de cloud. E aqui que entra a parte cripto. Vou pegar o exemplo da Helium para ficar mais fácil.
Através de uma nova rede blockchain que a Helium criou, onde roda um algoritmo também novo chamado proof of coverage (prova de cobertura), ela consegue visualizar os aparelhos que estão ligados, e gerando a rede, e bonifica esse participante com uma nova cripto que eles criaram, o HNT.
Esse incentivo é bastante grande no começo, mas decrescente com o tempo. Com o passar do tempo é esperado que a remuneração dos hotspots, que é como são chamados os aparelhos que compramos para colocar nas nossas casas, passe a ser pelo tráfego dos itens na rede e menos pela criação dos HNTs.
A conta é tão simples como você comprar um aparelho de USD 400,00, ligar na sua casa e ele começa a te gerar HNTs o tempo todo. A princípio o valor do HNT é próximo de zero, já que não há muitos aparelhos ligados e a utilização da rede é pequena. Mas, à medida que ela cresce, que novas soluções se acoplem a ela, mais itens sejam seguidos pela rede, e mais empresas a utilizem para acompanhar seus itens é de se esperar que o valor do HNT suba.
Isso porque o HNT é como se fosse o “dinheiro” da rede, já que para fazer o acompanhamento de um determinado item, uma coleira com um emissor em um cachorro, por exemplo, é necessário pagar para a rede em HNT, e esses HNTs são em parte distribuídos para os donos dos hotspots que “viram” aquele cachorro passar pela sua rede.
O HNT reflete também o valor dessa empresa já que se ele valer zero significa que não há ninguém utilizando ou acreditando que a Helium seja uma Startup que poderá ter sucesso. Fatores como a geração e destruição dos tokens HNT também são importantes de se observar.
Sem me alongar mais, como a rede Helium é uma rede de blockchain, as informações dos, aproximadamente, 90.000 hotspots já instalados é pública e, não é difícil encontrar hotspots que estão fazendo ao menos HNT 30,00 por mês, que com ao preço atual do HNT dá por volta de USD 300,00, ou seja, o investimento inicial retorna em pouco mais de 1 mês.
Vale colocar aqui que isso deve cair bem nos próximos meses pois a criação de tokens cairá pela metade em breve e já ouvi dizerem que há mais de 200.000 hotspots já comprados só esperando para serem entregues, então, como sempre, isso aqui não é uma recomendação de investimento e faça sua lição de casa antes de tomar qualquer decisão.
Um fator que não sei se perceberam é que a HELIUM não gastou nada para montar essa rede. Os hotspots são vendidos por empresas terceirizadas e pagos por nós, futuros mineradores. Ela só definiu os incentivos e modelo económico para a emissão do seu token. Quanto custaria para uma Vivo, AT&T, VERIZON, VODAFONE para montar isso? E no prazo que foi feito?
Bem, com esse exemplo acredito ter ficado claro que há formas muito interessantes de se dar incentivos económicos para a criação de redes descentralizadas em qualquer modelo de negócio onde isso faça sentido. E, apesar de ter citado apenas dois setores nesse texto, tenha certeza de que existem vários outros.
Cripto está tendo e terá um papel decisivo nesse movimento de descentralização, ao trazer uma forma bastante eficaz de alinhar incentivos económicos. Não é à toa que hoje há uma criação de mais de 200 tokens/projetos por semana.
Uma melhor user experience (UX), que fará com que não precisemos entender nada de programação, associado a uma cripto como incentivo econômico, tem um poder de mudança enorme para as estruturas centralizadas que temos hoje.
E você, já participa disso? Minera alguma cripto em casa? Conhece algum projeto similar em outro setor? Vem discutir comigo sobre ele.
*publicado originalmente na minha coluna da infomoney em 20.jul.2021
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